27 de set. de 2011

Caminhando

Na estrada. O verão aparentemente já deu seus últimos suspiros, e já dá pra sentir as manhãs frias de outono.

A natureza de Tohoku é realmente incrível. A estrada corta pelo meio de pequenos montes, cobertos por árvores altíssimas e de poucos ramos e por pinheiros. O cenário se alterna com algumas poucas planícies, com plantações de arroz e algumas casas de madeira de estilo tradicional. A cada 20 ou 30 minutos, uma cidadezinha.

Passei a última semana em Kesennuma, na província de Miyagi. Kesennuma é uma cidade costeira, a segunda mais afetada pelo Grande Terremoto do Leste do Japão, depois de Ishinomaki. Ao contrário desta, Kesennuma é muito menor (tem uma população entre 7000 e 8000) e não é um spot turístico. Estive com um grupo de estudantes voluntários para a recuperação da região; grupo organizado e bancado pela Fundação Japão (Nippon Zaidan), chamado "Gakuvo" (uma abreviação pra Gakusei volunteer, estudante-voluntário). Essa foi a terceira vez que participei de uma missão dessas, e foi a mais longa e pesada; e a cada vez que participo delas me surpreendo mais com os japoneses.

Existe um certo tabu que é difícil fazer amizade com os japoneses, que são pessoas fechadas e duras, mas não é bem assim sempre. Nosso grupo tem 28 pessoas, 8 ryuugakusei (alunos estrangeiros) e 20 japoneses, desde Fukuoka e Nara até Tokyo; tivemos oportunidade de conversar bastante e conhecer melhor uns aos outros. Na frieza e na correria de Tokyo, é normal achar que os japoneses são pessoas frias e talvez até egoístas, e esses momentos são importantes para conhecermos outros lados deles.

Uma das meninas trabalhando conosco trabalha no Outback (restaurante australiano) em Shibuya (bairro de Tokyo), onde fui com amigos brasileiros comemorar o aniversário de um deles. Imagino quantas pessoas não passam diante de nossos olhos, interagem conosco, e nós muitas vezes nem percebemos; passam como sombras, como meros objetos inanimados que não nos desperta atenção - já que normalmente estamos mais concentrados em nossos próprios pensamentos e nossa própria vida.

Outro dos meninos estuda na Shibaura Kogyo Daigaku (Universidade Tecnológica de Shibaura), no bairro onde eu moro. No nosso último dia de trabalho, ficamos em times diferentes: fui preparar sacos de pedra ("âncoras"), enquanto o time dele ficou responsável por remover janelas de uma casa vizinha à qual estávamos hospedados e fazer as compras para o churrasco de despedida. Ele se sentiu mal por ter feito um trabalho leve enquanto nos esgarçávamos carregando sacos de pedras, e - por isso - deixou todos tomarem banho antes dele. É apenas um pequeno gesto, mas é nesses pequenos gestos que se vê o caráter de alguém.

Dentre várias coisas, duas me impressionaram mais: no primeiro dia de trabalho, fomos recolher e separar destroços de um lugar que, outrora, era uma casa. Enquanto limpávamos o mato que, após todos esses meses, cobrira o local, tentávamos advinhar que parte da casa era cada canto do terreno. Mais tarde, um dos ryuugakusei, da Malásia, comentou: "nós tentávamos imaginar mas, com certeza, quem morava lá não veria aquilo como um monte de mato e destroços, mas como uma sala, um quarto; veria como uma coleção de memórias - uma vida." E, realmente, a cada sapato, cada brinquedo que encontrávamos pela frente, podíamos imaginar quantas lembranças não viveriam neles.

Outra coisa que me chamou a atenção, no segundo dia de trabalho, fui com um time para preparar sacos de pedra. Fomos para uma espécie de porto e trabalhamos com pescadores, todos já acima dos 60. Um deles, já nos seus 70 e poucos, estava lá carregando sacos de 55 kg com muito mais desenvoltura que nós estudantes. Em um dos intervalos de trabalho, um dos pescadores veio conversar comigo. Falou por mais de 5 minutos, dos quais mal-e-mal entendi o assunto. Ele falava de como o Brasil é um país rico e maravilhoso e de como os japoneses são inteligentes por terem ido se estabelecer por la. Acho que, realmente, somos abençoados, né?

Bom, é isso. Primeira parada da viagem de volta.
お疲れ様です!

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